Minhas raízes

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Uruguaiana

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

As histórias do Nicácio


A CAIXA D'ÁGUA
Esta história, tem 9 personagens que vão aparecer gradativamente no desenrolar dos fatos.
Existe no Plano Alto, uma praça que há alguns anos atrás era um dos pontos principais da Vila.
Essa praça que ainda existe, e hoje já não tem a mesma importância e o glamour de anos passados, fica no terreno onde está a estação ferroviária, que também teve muito valor na infância e vida de cada uma das pessoas que nasceram ou viveram nessa época, naquela localidade.
A estação também existe e ainda tem sua importância,só que hoje é uma importância diferente, sem influir diretamente na vida das pessoas que fazem parte da comunidade.
A importância de hoje, é no sentido de dar continuidade a movimentação de grandes composições que vão e vem, transportando mercadorias do centro do País para os Países do MERCOSUL.
A narrativa de hoje não é sob a estação.
A história é sob a importância que teve a velha caixa d’água que ainda se encontra lá, sem utilidade, mas majestosa, altiva,, imponente, como a dizer aos mais jovens:
Aqui estou, a observar a falta de respeito com a minha idade, sou velha é verdade, enferrujada, mas já fui jovem como vocês e na minha juventude, Fui de grande utilidade para esta comunidade da qual hoje vocês são parte.
Esta caixa d’água da qual falamos, foi em anos passados, companhia de um velho moinho, que imponente devido a sua altura, olhava os demais sempre de cima, alem de ter a nobre missão de fornecer água aos moradores através da nossa caixa, que não é a do governo e sim a velha caixa do Plano Alto.
No local tem um velho poço artesiano, que fazia parte do conjunto de objetos que citamos nesta narrativa.
O poço na escala de valores, sempre se sentiu inferior, por não aparecer, ser subterrâneo, mas era de uma utilidade fundamental, era o responsável pelo fornecimento da água potável que matava a sede dos moradores e nunca os deixou na mão, podiam existir as maiores secas nas redondezas, só faltava água quando o moinho quebrava, descendo do seu pedestal para ser xingado e amaldiçoado pelos moradores que não o perdoavam por estragar.
Nem sempre ele era o causador da falta de água, existia ainda a bomba, que submersa, sempre foi retraída, acanhada e não aparecia nunca a não ser quando quebrava e saia das profundezas do poço para ser concertada e elogiada com as palavras mais cruéis da comunidade.
Nesse quinteto, a Praça, o Moinho, o Poço, a Bomba e a Caixa, a disputa por atenção era muito grande, cada um queria ter o seu valor reconhecido.
Hoje quando contamos estes fatos, a situação é outra.
Tem um conjunto novo que abastece a comunidade e com certeza está tudo nos conformes, pois tudo que é novo é bom e eficiente, mesmo que não tenha a vivência e a experiência que só o passar dos anos acrescenta a seres e coisas.
É dentro deste contexto, que queremos relatar um fato acontecido, que na época foi muito comentado e causou alguns constrangimentos.
Vamos acrescentar quatro personagens que são os sustentáculos do assunto que estamos abordando.
São quatro pessoas dessa comunidade, dois já falecido um constantemente retorna ao seu habitat e o Zeferino, o Nicácio não sabe por onde anda.
Nicácio o guri de ontem, hoje é contador de histórias.
O velho da época, era o Tio João, conhecido de todos, e por morar em frente a praça, tinha a missão de zelar por aquele patrimônio que era útil para todos.
O Nicácio, autor deste conto era Negrinho da Vó Chata, que passava a sua infância como qualquer criança, brincando e fazendo arte.
O Vaneirinha tinha esse apelido, porque era metido a tocador de gaita de boca, só que por mais que insistisse como músico, não saia nada mais do que uma vaneira.
O Zeferino era filho de um velho ferreiro da Vila, mas praticamente criado com a Prof. Beda, hoje Patrona Benemérita da Escola.
Os moradores da Vila, sempre que passavam sedentos por uma água fresquinha, chegavam e saciavam a sede, usando um velho e enferrujado caneco feito de uma lata de compota de pêssegos que com certeza tinha deliciado antes de ser caneco, algum aniversariante da localidade.
Esse caneco ficava preso a uma pequena corrente feita de arame fino e ali ficava para ser utilizado quando necessário.
O Negrinho da Vó Chata como era conhecido nossa personagem, foi segundo os moradores mais velhos, o guri mais sem vergonha e arteiro da Vila.
Dizem até hoje as más línguas antigas e muitas atuais que ainda está para nascer outro tão puro como esse.
É claro, como diz o ditado quem conta um conto aumenta um ponto, dentro dessa filosofia, nem tudo que contam é verdadeiro, e muitas das que contam nem sempre era o Negrinho da Vó Chata, muitas vezes os protagonistas eram outros também impossíveis, mas quem levava a fama era sempre ele.
Mas esta que estamos contando é verdadeira, ainda existem algumas testemunhas do fato.
Certa feita, num verão daqueles que só ocorriam no Plano Alto e quem é cria de lá sabe como eram, vinha o Negrinho em baixo de um sol escaldante, a temperatura nas nuvens, em pleno meio dia, mas meio dia mesmo, porque não havia horário de verão, existia só o horário de Deus como muitos dizem até hoje e se recusam a aceitar essa novidade.
Lá vinha o Negrinho, louco de sede, pedindo como um pobre mortal, uma água gelada para refrescar a goela
Quando enfrentou a pracinha, fez o que todos faziam, dirigiu-se a uma pequena cancela que existia para dar acesso ao local da água, quando ouviu a voz do Tio João:
Que tu vai fazer ai Negrinho?
O Negrinho voltou-se e deu de cara com o Tio João que sempre estava camuflado numa sombra mateando, mas com uma visão total do ambiente.
Respondeu prontamente: Vou tomar água Tio João.
Não, respondeu o Tio João. Vai tomar água na tua casa, tu quer é fazer arte e isso ai não é pra brincadeira.
O Negrinho analisou a ordem recebida, pensou o que fazer, mesmo achando um absurdo ser proibido de tomar água como todos faziam, só porque era criança.
Era danado sim, sempre aprontava, mas era obediente e sempre foi orientado pela Vó Chata a respeitar e obedecer aos mais velhos.
Dentro destas circunstâncias, mesmo revoltado, deu meia volta e foi embora.
Passou todo o resto daquela tarde quente, matutando o acontecido, aquilo não podia ficar impune, algo tinha que ser feito para cobrar-se de tão grave agressão.
Resolveu procurar a sua parceria, a gurizada. Tão ou mais sem vergonha que ele para em conjunto analisarem e pensarem qual seria a resposta ao fato.
Juntaram-se e ele contou o acontecido, para surpresa de todos, isso não era um fato isolado, outros do grupo já tinham sido proibidos de beber água como ele.
Apesar de não ser o líder, nem sabia o que era isso, mas sempre foi respeitado dentro do grupo até por ser o mais peitudo nas falcatruas que faziam.
Sempre que surgiam esses tipos de problemas se reuniam e a decisão era acatada por todos.
Mas o Negrinho quando levou o problema a ser debatido, já tinha uma idéia na cabeça, só precisava do apoio dos demais.
As reuniões do grupo eram feitas no terreno da estação férrea.
O horário do passageiro, todos os dias era um acontecimento na Vila, os adultos desciam e embarcavam no trem, os maiores aproveitavam para namorar e os menores ficavam aprontando das suas.
Foi nesse ambiente que aconteceu a reunião do grupo.
Ali eram tomadas grandes decisões, é claro que nem sempre era
coisa boa, as vezes algumas safadezas como a decisão que foi tomada a respeito da proibição do Tio João.
Quando o Negrinho da Vó Chata contou o acontecido, a revolta e a surpresa foi geral.
A proibição era coisa costumeira, muitos já tinham sido proibidos de beber água na praça.
O tio João achava que guri não tinha sede e só iam até a praça para pisar nas flores, estragar e quebrar bancos, etc... na realidade era isso mesmo que a gurizada fazia.
Após as considerações e os elogios não publicáveis feitos ao tio João, venceu o plano apresentado pelo Negrinho da Vó Chata.
A reação tinha que ser em conjunto e de grande repercussão para que essa proibição fosse banida da praça.
Na Vila não tinha luz, a lua cheia deixava as noites claras demais para por em prática o plano a ser executado.
Ficou decidido, que esperariam as noites escuras para a execução da jornada.
Para não serem considerados radicais em suas decisões, decidiram que no intervalo da execução do plano, outros do grupo tentariam tomar água para testar as atitudes do tio João.
Todas as tentativas foram em vão, com exceção de dois deles que conseguiram tomar água sem problemas, os demais foram terminantemente proibidos de chegar a torneira.
Mais uma reunião foi feita para uma última análise, mas a decisão anterior foi confirmada sem problema.
Houve um pequeno impasse, e se não fosse possível no dia marcado executar o programa estabelecido para a realização do plano.
Após marchas e contra marchas, ficou definido que o Zeferino que era criado com a tia Beda, esposa do seu Londero proprietário de uma farmácia, resolveria a questão, conseguindo os ingredientes necessários para que ninguém falhasse na hora certa.
Todas as medidas foram tomadas e na noite marcada o plano entrou em execução.No outro dia, levantaram mais cedo do que de costume para ver o resultado da ação.
Começaram a passar no local e pressentiram que cada um que passava falava com o tio João, gesticulavam, esbravejavam e condenavam o acontecido.
Foi escalado um da dupla que não foi proibido de beber água, para fazer a sondagem a respeito do fato.
O escaldo, foi o Vaneirinha ( Adailson Falcão)( que era meio contra parente do tio João e por isso não foi proibido de beber água, mas com certeza quando descobriram esse parentesco, ficou claro que até lá no Plano Alto, naquela época, já existia o tal de nepotismo.
A novidade que o Vaneirinha trouxe foi a seguinte:
O copo usado para tomarem água na praça, tinha amanhecido cheio até a boca de M.... ( Feses ) e que o autor da proeza com certeza apesar de faltar as provas contundentes, tinha sido o Negrinho da Vó Chata, dizia o tio João para justificar sua acusação.
Três ontonte eu proibi ele de tomar água e com certeza em represália este ato condenado por todos, só podia ter sido o dito cujo.
GLOSÁRIO
Objetos – A Praça, Caixa d’água, Moinho,Poço e Bomba.
Perssonagens –
Nicácio o Negrinho da Vó Chata – José Vilmar P. de Medeiros
Tio João - João Souza
Vaneirinha - Adailson Falcão
Zeferino Soares:
1 - Foi o encarregado de surrupiar lacto purga pra gurizada, pra modo de não falharem na noite e hora marcada.
Obs.
2 – Vejam que nem tudo que contam sob o Nicácio o popular Negrinho da Vó Chata são verdades;
3- Passaram um longo tempo para acabar o trauma, pois cada vez
que alguém ia tomar água no novo copo, lembravam do acontecido com o velho copo e passava a sede.
Sant’Ana do Livramento, Fevereiro de 2009

2 comentários:

  1. Medeiros gostei imensamente e para surpresa minha a tia Beda e minha parente e eu viajava até Plano Alto com o tio Licurgo e minha avò Rosa Rissi Bottaro donde ficavamos hospedados.Lembro bem que ela tinha um "papagaio" e eu gostava de mecher com o bicho. Se tens noticias por favor informe. Quanto ao da lancha sem comentários.

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  2. Adorei... muito bom saber, história de um ente querido, contada de uma forma tão divertida...o Vaneirinha, é meu pai-avô. Li esta história pra minha mãe Dirley, que disse já ter ouvido o feito. Rimos muito!!! Devo contar que ele, progrediu não ficou só na gaita de botão..Aprendeu tocar gaita apianada(sozinho)...saia de vez em quando alguma valsa, xote; claro vaneira também! mas ele gostava muito dum tango...Um Abraço Aline Pereira

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